3. TEXTO MASSORÉTICO E AS DIFERENTES LEITURAS E TRADIÇÕES
A literatura rabínica remete à compilação, organização, edição e canonização
dos textos bíblicos hebraicos, a Ezra o Escriba (Esdras) e à Grande Assembleia no
século V antes da Era comum. A mostra de pergaminhos do Mar Morto do século II
antes da Era comum, encontrados na década de 50 do século XX e, que estão
expostos no Museu Santuário do Livro, em Jerusalém, testemunha a existência de
manuscritos bíblicos hebraicos do século II da Era comum redigidos com letras
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semelhantes às letras hebraicas recentes. Segundo a literatura rabínica, os textos
bíblicos hebraicos foram transmitidos nos centros de estudos bíblicos rabínicos até o
surgimento dos centros de estudos massoretas do século VI da Era comum. Os
massoretas tinham o objetivo de sinalizar a pronúncia dos escritos hebraicos.
Messorá significa "tradição". Existem três principais escolas de massoretas.
Os massoretas orientais se encontravam na Babilônia, nas regiões de
Nehardea, Sura e Pumbedita. Este ramo massoreta de origem babilônica esteve
ativo entre os séculos VI e IX, aproximadamente. A denominação “sistema
massoreta babilônico” refere-se ao local de surgimento dessa tradição massoreta,
que foi utilizada também em manuscritos hebraicos na Pérsia, na Arábia e no Iêmen.
Bibliotecas universitárias em Nova Iorque, Cambridge, Londres, Oxford, Paris,
Berlim, Frankfurt e São Petersburgo contêm atualmente cerca de 120 manuscritos
hebraicos de origem babilônica. A partir de 1890 foram encontrados muitos
manuscritos massoretas babilônicos na guenizá (depósito de textos bíblicos falhos
ou sem utilidade) da Sinagoga Ibn Ezra, do Cairo, e parte destes manuscritos datava
do século VI ao século IX. Os massoretas babilônicos desenvolveram um sistema de
vocalização, de acentuação e de anotações próprio.
Os massoretas ocidentais se encontravam nas regiões da Samária, Judeia e
Galileia (Palestina) e em Tiberíades. Este ramo esteve ativo entre os séculos VIII e
IX, ao passo que o de Tiberíades esteve ativo durante os séculos IX e X. A tradição
palestina é representada por poucos manuscritos. Já a quantidade de manuscritos
massoretas de Tiberíades é abundante. Neste contexto, é importante lembrar que o
Pentateuco Samaritano é até hoje escrito em letras proto-hebraicas. Os manuscritos
compilados pelos samaritanos acompanhados dos manuscritos dos profetas e dos
escritos hebraicos foram editados pelos escribas da Bíblia Hebraica. Acredita-se que
o texto bíblico em letras proto-hebraicas ou hebraicas originais até quase o final do
quinto livro do Pentateuco é resultado de compilações consecutivas dos manuscritos
originais de Moisés. Contudo, não os manuscritos do Pentateuco Samaritano em
letras proto-hebraicas ou hebraicas, e, sim, os manuscritos da Bíblia Hebraica com
letras assírias hebraicas foram estudados e pontuados muitos séculos depois pelos
massoretas.
Os massoretas de Tiberíades tinham como objetivo registrar a pronúncia do
hebraico bíblico no que se refere aos fonemas vocálicos, acentos e entonação. Os
massoretas de Tiberíades foram influenciados pela cultura árabe, pelo siríaco e pelo
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hebraico antigo. A Messorá de Tiberíades, com o passar do tempo, tornou-se padrão
para o texto da Bíblia Hebraica. Os massoretas tiberienses se dividiam entres as
escolas de Ben Asher e Ben Naftali. O sistema da escola de Ben Asher foi adotado
em todas as edições impressas da Bíblia Hebraica.
Os mais importantes manuscritos da Bíblia Hebraica existentes, o Códice de
Aleppo e o Códice de Leningrado, estão ligados à tradição massoreta da escola de
Ben Asher. O códice que representa a tradição de Ben Naftali é o Códice
Reuchliniano, que não pode ser considerado autêntico, escrito por volta de 1105-
1106 na Itália. O Sêfer a Hilufim de Misael ben Uziel, escrito aproximadamente em
1050, trata das diferenças entre as duas escolas de massoretas de Tiberíades.
A atividade massoreta foi dividida entre três pessoas: o sofer é o escriba que
escreve o texto consonantal, o nakdan é o pontuador, que coloca os pontos
vocálicos (sinais de vocalização e de acentuação) e o Baal HaMessorá que colocava
as anotações massoretas. Posteriormente, uma única pessoa passou a ser
responsável pelas três etapas.
Devido ao fato de que o início da compilação de textos da Tradição Oral do
Povo de Israel que estruturam os fundamentos e a exegese e da doutrina rabínica
ocorreu no século II da era comum, tanto eles como as redações do Talmude
Jerusalemita e do Talmude Babilônico antecedem as escolas massoretas. No século
XII, textos do Talmude foram queimados em praça pública, em Paris na França.
Contudo, o Talmude Babilônico foi censurado e impresso pela primeira vez em
Veneza, logo após a primeira impressão da versão Mikraot Guedolot da Bíblia
Hebraica. As impressões do Talmude e da Mikraot Guedolot em Veneza foram
executadas por Daniel Bomberg, a pedido do Vaticano.
Existem vários costumes de origem religiosa e geográfica na maneira de se
ler os fonemas hebraicos bíblicos. Atualmente existem também inúmeras variações
de pronúncia de imigrantes vindos de muitos países para Israel e que, aos poucos,
intensamente, estão transformando a maneira de falar dos israelenses.
O assíduo trabalho dos massoretas (grafar fonemas e entoações e indicar as
consoantes que assumem sons de vogais nos textos bíblicos hebraicos) contribuiu
para o desenvolvimento e redação do hebraico medieval e dos dialetos judaicos e,
posteriormente, do hebraico moderno.
Os costumes judaicos, a vocalização e a pronúncia dos fonemas hebraicos
bíblicos revelam a origem geográfica dos líderes ou da maioria dos membros de
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uma determinada comunidade judaica. Cada costume judaico é oriundo de uma
determinada região ou país e pode ainda apresentar uma ou mais vertentes
próximas e distintas de costumes e da pronúncia revelando a especificidade de suas
províncias natais.
Os principais costumes religiosos judaicos são designados pela sua região de
origem: asquenazita (europeia oriental), sefaradita (Península Ibérica), misrahi
(oriental), temani (iemenita), italki (italiano), farsi (persa), etc.
Um famoso exemplo de diferenças entre as vocalizações das escrituras hebraicas
bíblicas ocorre na pronúncia das vogais. Aliás, a pontuação que representa as
vogais hebraicas não é encontrada nas escrituras hebraicas bíblicas; ela surge em
textos exegéticos paralelos que têm o objetivo de conservar a tradição fonética.
Por exemplo, a pontuação kamats é quase sempre pronunciada como a vogal
"a" no costume sefaradita, equivale à vogal "o" no costumes asquenazita e iemenita
e é vocalizada como a vogal "u" na pronúncia judaica húngara. O hebraico moderno
adotou a pronúncia do kamats sefaradita. A palavra kamats em hebraico significa
"contração", simbolizando que a boca é contraída (fechada) para vocalizá-la,
portanto sua pronúncia pode ser "ã", "â", "o" e "u."
Outro exemplo menos conhecido é a pronúncia da pontuação sheva, que
representa o som da vogal "e" de maneira curta e rápida. Esta pontuação,
pronunciada pelos sefaraditas, não é sentida pelos asquenazitas, tampouco no
hebraico moderno. Os italkim (plural de italiano) pronunciam a variação fraca da
última letra do alfabeto hebraico com o som da letra "d", os asquenazitas a
pronunciam com o som da letra "s" (ou semelhante ao "th" em inglês) e os
sefaraditas a pronunciam como a sua variante forte, com o som da letra "t."
Essas pequenas diferenças de pronúncia são perceptíveis na leitura ritual dos
textos bíblicos hebraicos. É importante a conscientização dessas nuanças para que
não haja confusões semânticas. O programa BIBLE II apresenta a leitura das
escrituras hebraicas bíblicas na melodia asquenazita e na sefaradita. Pode-se
acessar, na internet, a melodia asquenazita com pronúncia hebraica moderna:
<http://bible.ort.org/>.
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